quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

E no início era um incêndio

Depois de andar quase uma hora de ônibus e por mais de duas horas a pé finalmente chegamos ao tão sonhado sítio.
Não esperávamos nada demais, afinal o sítio da tia do Tiaguinho era o último do último do Córrego do Soldado. Tanto que logo na entrada, havia um par de botas deixadas por Judas quando ele passou por lá.
Ficamos alguns minutos contemplando a casa. Um curral na frente, duas janelas, um corregozinho correndo a esquerda com uma pinguela para se atravessar.
Eu, cansado depois de correr atrás de uma charrete que não me levou a lugar nenhum e depois de litros de Coca-cola quente, que me fervilhavam o intestino até àquela hora da manhã, achei o lugar um palácio, pelo menos por fora. Subimos todos a pequena escada. Éramos uns 12 naquele sábado, o resto do pessoal viria no domingo pela manhã.
Junto conosco, carne, bebidas, arroz, que o Aldair não esqueceu e outras bugigangas. Todos famintos, por comida, bebida e principalmente diversão. O Tiago tinha nos prometido várias cachoeiras. Mas, sempre tem um mas, depois dos 15 minutos de caminhada que se estenderam por mais de 2 horas, já desconfiávamos da veracidade da queda d’agua.
Ao abrir a porta, ela fez um inhec. Sinal que ela abria poucas vezes durante o ano.
- Putz, pensei. Agora só falta eu, nessa canseira, ter que arrumar essa casa.
Para o meu espanto o lugar, por dentro, era ainda maior e estava lim-po. A tia do Tiago tinha pedido a não sei quem para limpar a casa.
Assim que entramos, percebemos uma pequena salinha, dois quartos. O da esquerda já descartamos logo de cara. Credo! O quarto tinha só uma cadeira. Nada de móveis. Parecia aqueles quartos de filme de terror dos anos 80.
Aliás, no meu pensamento a qualquer hora o Jason, da série “Sexta-feira 13”, apareceria com a moto serra. Sorte que não havia lago.
Logo depois uma copa, com um banheiro e mais dois quartos. Desta vez grandes, um com uma cama de casal e outro com beliches. Depois uma cozinha, não me lembro se tinha despensa. Uma área de serviço e acabava-se a casa. Aconchegante até. Tipo aquelas casas de fazenda antiga com assoalho.
Fomos logo deixando as coisas e tratando de nos acomodar. Era confuso demais. Cada um querendo a melhor cama. Por fim, já cansados e com fome nos dividimos.
A primeira coisa que tratamos de fazer foi o almoço. Na verdade, a primeira coisa foi ligar a porcaria da bomba d’agua para encher a caixa. Pior que a bomba ficava longe da casa, só para variar. Dividimos as tarefas. Enquanto alguns varriam a casa, outros tratavam de preparar o almoço, ligar o som, acender a churrasqueira. Colocar a bebida para gelar e assim por diante.
O Júlio, o Tiago e o Aldair ficaram com o almoço. Era engraçado demais ver o Tiaguinho com um pano de prato no ombro, pedindo para a gente não quebrar nada, tomar cuidado com isso, com aquilo, com aquilo outro.
Para delírio do Aldair, ele achou um pacote de feijão preto.
- Ai que delícia, vamos cozinhar feijão.
- Aldair, não tem panela de pressão. Onde você vai cozinhar isso.
- A gente coloca um tanto d’agua numa panela, quando ferver coloca mais água e assim ele vai cozinhando.
Preciso dizer que se você, caro leitor, acha que o fogão era a gás, esqueça. Era a lenha. Que se você acha que as panelas eram limpas e de alumínio. Esqueça mais ainda. A panela que o Aldair colocou o feijão era de ferro. Da época em que o ferro ainda era escrito com PH. Se é que um dia foi assim.
A panela de arroz era de barro, pelo menos um dia foi. Enquanto os nossos cozinheiros se desdobravam na cozinha, nós investigávamos o lugar, menos o quarto apelidado “morte do demônio”, outra alusão a um filme de terror dos anos 80.
A casa era de assoalho, por baixo havia uma espécie de porão. Pelas gretas era possível ver que ele estava abandonado há décadas.
Descobrimos que eles não colocavam punhados de veneno para ratos. Eles rasgavam a caixa inteira. Imagina quantos roedores existiam ali.
Quando saímos para o quintal, o Tiaguinho gritou:
- Não vão perto do silo não, porque lá tem muita cascavel, por causa dos ratos.
A pinguela que tinha visto na chegada era um tronco de coqueiro caído no leito do córrego, com um bambu atravessado servindo de corrimão.
A casa, que antes era morta, com nossa presença pareceu criar vida. Depois de atravessarmos a ponte improvisada, para chegar onde o córrego era mais fundo, descobrimos um poço. Àquela hora, naquele calor, decidimos mergulhar ali mesmo.
Não lembro quem foi o primeiro, só me lembro de vários terem pulado do barranco, de bomba, o primeiro que levantou foi o Dodete:
- Credo é puro barro este fundo.
Saímos todos lá de dentro, meio homem, meio barro. Minutos depois secando ao sol, a profecia tinha se cumprido, voltamos ao pó.
Ficamos brincando naquela água, quando de repente alguém gritou:
- A casa está pegando fogo.
Quando olhei, existia fumaça demais na casa. Só podia ser um incêndio mesmo. A fumaça vinha da área de serviço. Sabia que cozinhar no fogão a lenha não ia dar certo. Corremos todos. Eu, para variar fiquei para trás. Quando fui passar pela pinguela, ela já estava toda molhada, enlameada. Com cuidado fui passo a passo pelo coqueiro.
O Fabrício, vendo meu temor, voltou. E com um sorriso sarcástico no rosto, balançou o corrimão improvisado. Resultado: cai naquela água esverdeada.
Cheguei por último na casa, aproveitei que era o último a chegar e ainda peguei um balde d’agua em um cocho, para apagar o possível incêndio.
Ao chegar lá, percebi que o fogo era na verdade alguém tentando acender a churrasqueira.

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