segunda-feira, 28 de março de 2011

Feijão que não cozinha ou de como uma cachoeira só é bobagem





Depois que eu cheguei claudicando (novidade) na área de serviço, com um balde na mão para apagar o incêndio, descobri que o fumaceiro todo no sítio da tia do Tiaguinho era nada mais nada menos que um dos meninos tentando acender a
churrasqueira.
O lugar estava empesteado de fumaça. Lá na cozinha, o Aldair teimava em cozinhar feijão preto, que até aquela hora, quase uma hora e meia depois de acendermos o fogão a lenha, estava apenas enrugadinho e duro como um porrete. O Aldair jurava a nós que seu método de cozinhar feijão iria dar certo. Era só esperar ferver que ele colocava água fria. Bom, até aquele momento, não sei quantas águas depois, feijão cozido negas de catiribecas.
O fogo ardia na churrasqueira, as panelas queimando no fogão e a gente ali. Eu com o joelho dolorido, depois que o Fabrício tinha me derrubado na pinguela, e mais verde (por causa d'água com lodo) do que o incrível Hulk. O resto da galera se
divertindo.
Resolvemos colocar a carne naquele misto de fumaça, fogo e nada de brasa, que chamávamos de churrasqueira. Menos de meia hora depois o almoço estava servido. Arroz, salada de tomate com alface e carne esturricada por fora e nem um pouco assada por dentro.
A cada dentada no pedaço de contra-filé a gente ouvia:
- Muuuuuuu – de tão crua que a carne estava.
O feijão do Aldair? Bem o feijão do Aldair estava lá naquela panela de ferro com PH. Cozido? Ahhh gente! As casquinhas ainda nem tinham começado a amolecer.
O dia tinha começado cedo e não eram nem três horas da tarde. Já percebeu como dia passa lento na roça? Meia hora parece uma eternidade.
Depois do almoço ficamos ali, na lombeira. Para quem leu Monteiro Lobato, sabe que nestas horas é que se costuma ver Sacis. Eu não duvidei que a qualquer momento o perneta aparecesse.
Naquele fim de mundo, com o sol escaldante, naquela hora, era perigoso vir o Saci, a Mula sem cabeça e por aí vai. Mas o negrinho não veio e ficamos ali de bobeira. Meia hora depois o Tiago diz:
- Vamos lá cachoeira?
Para quem acompanha esta história sabe que o Tiago tinha nos prometido várias cachoeiras, mas tinha nos prometido também que o sítio ficava a apenas 15 minutos de caminhada. Chegamos ao local, depois de passar seis porteiras e quase
duas horas e meia depois.
Só o anúncio da cachoeira me causava frio nos ossos. Não por causa da água. Mas pela caminhada. Temia, de novo, ficar caminhando pela estrada infinita.
Arrumamos nossas coisas e partimos. O Aldair deixou o feijão preto no fogo. Segundo o Tiago, a cachoeira era perto e como no fogão a lenha só havia brasas, não precisaria voltar com freqüência, para coloca água no feijão é claro.
Caminhamos por outra estrada durante uns quinze minutos, quando o Tiago disse:
- Chegamos.
- Chegamos onde? – perguntei eu.
Para cima era só pasto, para baixo, só pasto. Uns 300 metros abaixo uma mata fechada.
- É ali embaixo. A cachoeira fica depois da mata.
Sinceramente. Minha vontade foi de chorar. Já tinha pensado que ficaria sem comida, corrido atrás de charrete, sido derrubado em uma água fétida, almoçado carne crua e o gente boa (tá bom, ele é gente boa sim, aliás da melhor qualidade)
do Tiago, me mostra uma mata cerrada e diz que a cachoeira prometida era ali?! Bom estava ferrado mesmo, melhor descer.
Começamos a descer o pasto, com mato na canela. Na verdade, a mata não era tão densa quanto aparentava. Logo depois das primeiras árvores, aquele córrego que passava no fundo da casa do sítio se transformava em um pequeno riacho e havia muitas pedras. Realmente ali havia uma cachoeira com um poço.
- Viu, falei com vocês que valia a pena – disse o Tiago vitorioso.
Realmente o lugar era bonito. Mas, sempre tem um mas, ensombreado por completo. O Bruno, o mais forte, se aventurou por entre as pedras cobertas de lodo, chegou a beira do poço e ploft, mergulhou. Subiu já com uma redoma de gelo em volta, igual aos desenhos animados:
- Pus pariu Tiago. Essa água ta mais gelada que a da geladeira.
Era verdade. Com a sombra e as pedras e como desde Adão e Eva apenas Judas tinha passado por lá, a água corria na sombra, entre pedras e debaixo das árvores, isso a tornava mais que gelada. Aquilo, a cada mergulho fazia o pintinho da gente se encolher cada vez mais.
Para não enfrentar o lodo das pedras e não cair, dei a volta no mato. Pisei em uma folha de coqueiro cheia de espinhos e fui limpar o sangue na água gelada.
Ficamos dez minutos ali e o Tiago disse que mais para frente tinha outra queda d'água, mas era só uma queda sem poço.
Decidimos ir para lá. Na subida, o Samir ainda viu uma jibóia engolindo um sapo.
Chegamos na tal queda d'água. Na verdade, era um paredão rochoso. Tínhamos que saltar vários vãos de pedra. Tínhamos não, eles tinham. Porque eu não conseguiria saltar aquilo nem se nascesse de novo. Fiquei no topo mesmo, longe dos meus amigos, mas me divertindo em um pocinho formado logo no início do paredão.
Aquela queda era melhor. Tinha sol, a água corria entre as pedras. Ficar ali era bom. Quase uma hora depois que chegamos, o Aldair grita:
- Gente, meu feijão.
E lá se foi ele correndo rumo a casa para colocar água no feijão. Quando voltou o sol já tinha ido embora perguntamos:
- E aí? Já cozinhou?
- Não ainda não, mas vai ficar bom.

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